Especialistas avaliam que tecnologia é essencial para inclusão e diversidade nas empresas

Agentes do “S” da sigla ESG, como a cientista Nina da Hora e o ator Lázaro Ramos, destacam ainda a importância de uma gestão empática para reter e gerar valor

Nas últimas duas décadas, a gestão de pessoas pautada no pilar de Inclusão e Diversidade experimentou uma mudança radical de direção, influenciada fortemente pelas novas tecnologias, sendo as redes sociais as protagonistas desse movimento. Se, no início do milênio, falar de pluralidade era raro nas empresas brasileiras, nos dez anos mais recentes, a realidade é outra, inclusive com perspectivas de ganhos financeiros.

O novo cenário aponta para o papel decisivo da tecnologia na transformação dos negócios. “Começaram a surgir as primeiras pesquisas que mostram que diversidade traz criatividade, inclusão e dá dinheiro. As coisas estão acontecendo, sempre tendo o entendimento claro de que é um processo de transformação cultural. É preciso coragem para desafiar o status quo até para reconhecer preconceitos e privilégios, e pensar como trabalhar para algo maior, que seja inclusivo. Percebemos isso internamente. Hoje, temos um ambiente que permite o pertencimento. Temos 33% de pessoas negras na PwC, em todas as áreas, e, no geral, temos um pouco mais mulheres do que homens na firma”, destaca o sócio e líder de Inclusão e Diversidade da PwC Brasil, Leandro Camilo.

Para além do algoritmo

Na esteira da discussão da relevância das ações de Inclusão e Diversidade para as organizações, um ponto desponta quando a tecnologia é posta em perspectiva: a função do algoritmo na manutenção ou combate de preconceitos. A cientista, pesquisadora e diretora do Instituto da Hora, Nina da Hora, acredita que é preciso dar vazão ao tema dentro e fora das empresas para explorar a problemática.

“Para esse debate de tecnologia, precisamos visibilizar o que é e foi feito por pessoas negras para combater o racismo. Quando estamos falando de viés algorítmico é quando um programador está pensando o código pensando, por exemplo, em homem ou mulher apenas. Não é inclusivo. Pessoas negras, o que aconselho é que não é nosso papel resolver o racismo, mas é nosso papel nos proteger como comunidade. E, pessoas brancas que querem participar e têm interesse, vocês são uma parcela importante da sociedade e são muito bem-vindas”, conclui.

Lideranças

Outra questão tem a ver com o papel da liderança na pauta de Inclusão e Diversidade, numa trajetória em que o protagonismo dos líderes seja ativo. “A jornada de diversidade precisa ter um CEO que fala abertamente do tema. Há muitas empresas em que isso está no RH, que tem um papel fundamental, mas é preciso que os CEOs tratem do assunto, para que seja estratégico para a empresa”, disse a gestora-executiva do Movimento Mulher 360, Margareth Goldenberg. A diretora-adjunta no Instituto Ethos, Ana Lúcia Melo, vai na mesma direção. “Havia uma acomodação na média liderança com a ausência de diversidade nas empresas. Precisamos entender esse aspecto”, disse ela, ao comentar um estudo com as 1.100 maiores empresas sobre diversidade que está previsto para ser lançado no início de 2024 pelo instituto.

O ator, apresentador, cineasta e escritor Lázaro Ramos tem uma visão complementar quanto ao papel das lideranças. Para ele, há potência em quem não está nesses cargos, e é preciso ouvir essas pessoas. Ele ainda provoca a reflexão sobre mudanças por meio da sensibilização. “Muita gente não sabe que tem direito a sonho, muita gente não sabe que tem caminho e muita gente não sabe que tem potência. As pessoas que não estão no sistema de gestão são transformadoras do ambiente. E isso é crucial para a inovação. Vejo muito isso na produção artística. As informações estão aí, a consciência está mais palpável, mas a sensibilização, não. As pessoas estão se conscientizando, mas não se sensibilizando. Avanço tem, como a ação que estamos vendo aqui hoje, que é o compromisso das empresas de tentar transformar uma compreensão do que é esse tema. A representatividade hoje já não basta. A gente precisa ter representação positiva e presença, nem todos os negros sao iguais”, analisou.

A sócia da PwC Brasil, Tatiana Fernandes, acompanha a reflexão do ator. “A oportunidade também é fazer todo mundo se sentir incluído. E as habilidades para isso passam por ouvir mais. Desenvolver jovens que só precisam de oportunidade”, ela comentou.

Protagonismo e redes sociais

Para o fortalecimento do pilar de Inclusão e Diversidade no debate público e no ambiente corporativo, as redes sociais têm papel de fomento da transformação, ao mesmo tempo que são propícias para ataques e propagação de discurso de ódio. A advogada especialista em direito antidiscriminatório Fayda Belo questiona o protagonismo de cada indivíduo dentro desses espaços e põe em xeque o papel do Legislativo e das organizações privadas na luta contra o preconceito.

“O que você é offline, ou diz que é, precisa ser você quando está on-line. Que papel você tem realizado para que o Brasil seja um país mais equânime, sem opressão e plural? Isso é papel do governo? Não. É papel de todos nós. Quem faz as leis, quem fiscaliza e quem pune são resultado de uma estrutura formada historicamente com base no preconceito. O Poder Público existe para dar o mínimo para as pessoas, mas, por outro lado, as empresas precisam lembrar que são feitas de pessoas e se voltam também para pessoas. A gente precisa evoluir de forma coletiva. A gente existe para um todo, para que o coletivo avance, porque quando o todo avança, a gente avança junto”, afirma.

Ainda que existam avanços no debate das pautas antidiscriminatórias dentro das redes, o influenciador, criador de conteúdo e ativista anticapacitista Ivan Baron considera que o debate que contempla as pessoas com deficiência acaba ficando em segundo plano. Na visão dele, é preciso ter mais gente falando sobre e assumindo protagonismo. “Até hoje, se fazemos uma busca na internet por capacitismo, vai aparecer como se a palavra estivesse escrita errada, mas, aos poucos, eu consegui driblar o algoritmo. Acredito que a gente tem que tirar todo o sentido da palavra ‘padrão’ usada para falar de pessoas. Aos 5 anos, quando ligava a TV, não tinha ninguém para ser minha referência, porque a narrativa era sempre a mesma, o bizarro ou quando a gente usa a dor do deficiente para se satisfazer. Eu disse que não queria mais essa narrativa. E hoje sou empoderado, feliz com meu corpo”, diz.

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