Estudo aponta os rumos da indústria de entretenimento e mídia

Apesar da crise, as expectativas são positivas e o setor deve se recuperar nos próximos cinco anos no Brasil

A pesquisa Global Entertainment & Media Outlook 2020-2024, da PwC, constata que a pandemia da Covid-19 acelerou e amplificou as mudanças no comportamento dos consumidores, impulscionou a ruptura digital e definiu pontos de transformação da indústria que não seriam alcançados por muitos anos. A digitização, uma das principais forças que moldam todas as indústrias, foi intensificada pelo distanciamento social e pelas restrições à mobilidade. Como resultado, a indústria do entretenimento e mídia em 2020 se tornou mais remota, mais virtual, mais transmitida sob demanda, mais personalizada e –pelo menos, por enquanto– mais centrada no cenário doméstico do que qualquer previsão feita no início do ano.


Crescimento da indústria se contrai de forma acentuada

A pandemia fez com que o crescimento da indústria global de entretenimento e mídia fosse interrompido de forma abrupta –forçando também o desenvolvimento da pesquisa por mais três meses, de modo a tratar adequadamente dos impactos provocados pela Covid-19. Em meio a uma recessão global, 2020 terá a queda mais acentuada na receita do setor nos 21 anos de história da pesquisa, com um declínio de 5,6% em relação a 2019:  mais de US$ 120 bilhões em termos absolutos. Em 2009, o último ano em que a economia mundial encolheu, os gastos globais com entretenimento e mídia caíram apenas 3%.

Esse fenômeno também foi observado no Brasil: a recessão sobre a indústria de entretenimento e mídia em 2020 é esperada em 6,5% em relação a 2019, o que representa um declínio de US$ 2,5 bilhões apenas neste ano. Apesar disso, as expectativas são positivas e a indústria entretenimento e mídia deve se recuperar nos próximos cinco anos, com crescimento anual médio esperado de 2,47%, lastreado principalmente na transformação digital.

Embora ainda tenhamos impactos na economia global, a previsão da PwC mostra que a trajetória de crescimento da indústria continua forte. Nos últimos anos, à medida que as experiências de mídia se tornaram cada vez mais centrais nas vidas das pessoas, o crescimento global de E&M geralmente ultrapassou o PIB. Da mesma forma, depois dos desafios de 2020, é esperado que o setor reassuma seu melhor desempenho.

As projeções da PwC mostram que, em 2021, os gastos com entretenimento e mídia vão crescer 6,4%. Olhando para o período de 2019 a 2024, a previsão é de crescimento da receita geral em uma taxa composta de crescimento anual de 2,8% (CAGR).


Os cronogramas dos pontos críticos aceleram

Como é o caso da economia em geral, os desafios enfrentados pela indústria de E&M não são compartilhados de forma igualitária pelo setor. As dificuldades são mais eminentes em segmentos literalmente fechados pela Covid-19: música ao vivo, cinema e feiras. Os gastos com publicidade, por exemplo, terão queda de 13,4%. Já a transição dos jornais impressos para o digital foi acelerada em vários anos, reduzindo as receitas de impressão. 

Como resultado, os segmentos de E&M estão sendo transformados muito antes do que havia sido projetado inicialmente. Um exemplo é a bilheteria do cinema versus vídeo sob demanda por assinatura (SVOD). Em 2015, a receita de bilheteria era três vezes maior que o SVOD. A receita de SVOD ultrapassará a da bilheteria em 2020 e deve aumentar nos próximos cinco anos, atingindo mais do que o dobro da bilheteria em 2024. Outro exemplo é a quantidade de dados consumidos em smartphones em comparação com a banda larga fixa. Após uma pequena liderança em 2019, o smartphone agora deve se destacar como o principal dispositivo usado pelos consumidores para acessar a internet em nível global.

Surgem vencedores e perdedores…

Como as mudanças aceleradas pela Covid-19 estão acontecendo em diferentes segmentos da indústria? Com as pessoas ficando em casa, o vídeo over-the-top (OTT) viu a receita global crescer 26% em 2020 —e continuará crescendo nos próximos anos, quase dobrando de tamanho, de US$ 46,4 bilhões em 2019 para US$ 86,8 bilhões em 2024. O lançamento da plataforma de streaming Disney+ no final de 2019 não poderia ter vindo em um melhor momento: tendo projetado entre 60 milhões e 90 milhões de assinantes pagantes até 2024, o serviço alcançou 60,5 milhões no início de agosto de 2020. Dado o aumento do streaming, o consumo global de dados é outro beneficiado pela aceleração digital provocada pela Covid-19 —a previsão é que haja um aumento de 33,8% em 2020, passando de 1,9 quatrilhão de megabytes em 2019 para 4,9 quatrilhões em 2024 (mais que o dobro).

Do outro lado da balança estão os segmentos mais atingidos. Com muitos cinemas fechados e lançamentos de filmes atrasados, as estimativas da PwC são de que as receitas do cinema em todo o mundo cairão quase 66% neste ano. E não é provável que o terreno perdido seja recuperado; em 2024, essa receita deve ficar abaixo do nível de 2019. Outro impacto relacionado à Covid-19 é que o declínio contínuo e global da compra de jornais e revistas acelerou drasticamente em 2020, com as receitas caindo em mais de 14%, sendo as mais atingidas as revistas de variedades. Dessa forma, o digital oferece uma ponta de esperança: em 2023, essas publicações verão sua receita global de publicidade digital ultrapassar a da publicidade impressa. Outros setores importantes vão lutar para recuperar o crescimento perdido em 2019. No setor global de publicidade, por exemplo —que cairá 13,4% em 2020 para US$ 559,5 bilhões—, o crescimento não deve retornar ao seu nível de 2019 até 2022.

…enquanto uma vasta indústria se reconstrói

Algumas mídias “tradicionais” se mantiveram, apesar dos efeitos da Covid-19 e da aceleração digital. Em meio a relatórios de alta de vendas de livros durante os lockdowns, a receita global nesse segmento deve continuar sua trajetória ascendente, aumentando 1,4% a cada ano, entre 2019 e 2024, para chegar a US$ 64,7 bilhões. De forma significativa, a tecnologia está desempenhando um papel importante, com o uso crescente de smartphones e alto-falantes inteligentes, o que aumenta a aceitação dos audiolivros, permitindo que os consumidores os ouçam quando estão em trânsito.

O setor de videogames e e-sports foi um dos que se beneficiaram com a quarentena: como os consumidores ficaram longos períodos isolados, as plataformas de jogos registraram alto uso e engajamento –na Itália, por exemplo, a rede Telecom Italia registrou, na primeira semana de confinamento, um aumento de 70% do tráfego de internet devido aos jogos on-line. A expectativa para o setor em 2021 é de um aumento da receita da ordem de 7%. No caso dos e-sports, o crescimento esperado é maior: de 29,7% —e só em relação à receita de vendas de ingressos para eventos e campeonatos a expectativa é de um aumento de 176,6%.

No campo a realidade virtual e aumentada, alguns equipamentos (como fones de ouvido) vinham sendo vendidos antes da Covid-19, promovendo uma expectativa de recuperação para 2021 e um crescimento da receita de 23,1%. Plataformas sociais também devem indicar aumento de atividade, pela participação em jogos e eventos virtuais. Entretanto, devido aos custos dos equipamentos, a tendência é que esse tipo de investimento seja um dos primeiros deixados de lado à medida que a economia demora a se recuperar.

O segmento de eventos presenciais ao vivo é outro que busca se adaptar à realidade de um mundo digital acelerado. Com salas de concerto, centros de exposições e estádios fechados durante grande parte do ano, alguns desses eventos estão usando plataformas digitais para se manterem conectados com seu público. No Reino Unido, o Festival Wireless de Londres se uniu à empresa de tecnologia MelodyVR em meados de 2020 para oferecer apresentações gravadas de realidade virtual de artistas como Cardi B, Travis Scott e Migos. Cerca de 130 mil pessoas de 34 países participaram virtualmente.

Um ano à parte

Embora 2020 tenha sido um ano desafiador e perturbador para a maioria das indústrias —incluindo muitos segmentos de E&M—, está claro que a demanda do consumidor por variedade e expansão das opções de mídia agora em oferta continua a crescer. Os números da receita no Media Outlook deste ano refletem toda a força das crises econômicas e da aceleração digital desencadeadas pela Covid-19, mas a perspectiva de longo prazo para a indústria como um todo permanece positiva. Também está claro que, à medida que a normalidade retorna, ainda que lentamente, o cenário continuará apresentando vencedores e perdedores.

“Está claro que a Covid-19 acelerou a transição para o consumo digital e desencadeou mudanças perturbadoras em muitas formas de mídia, tanto positivas quanto negativas. No entanto, é evidente que os pontos fortes da indústria de E&M e o apelo aos consumidores continuam fortes como sempre. Embora ainda existam desafios para as empresas do setor conforme avançamos para além da pandemia, a migração digital que ela impulsionou também vai gerar oportunidades em todos os segmentos, não apenas para aqueles que se beneficiaram com seus impactos até o momento”, comenta Werner Ballhaus, líder global de Entretenimento e Mídia da PwC.

Os impactos da pandemia demandaram uma rápida reação dos players da indústria e a agilização da transformação digital, levando em consideração os novos hábitos de consumo, e trouxe reflexões relevantes sobre novos modelos de negócio e de interações com o consumidor. “Determinados setores mostraram sua resiliência no pior momento da crise, sempre fortalecidos pela influência digital, enquanto outras áreas se ressentiram, em especial aquelas cuja experiência presencial do consumidor é fundamental”, explica o líder de Entretenimento e Mídia da PwC Brasil, Ricardo Queiroz.

Apesar dos impactos negativos sentidos em 2020, o estudo mostra que há desafios importantes na indústria como um todo e que há perspectivas muito positivas de crescimento a médio prazo em todos os segmentos, sempre impulsionados pela evolução digital das empresas e dos novos produtos e modelos de negócio. “Esperamos que o próximo ano já apresente reflexos importantes da recuperação dos negócios da indústria de entretenimento e mídia”, diz Queiroz. 

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